Paternidade

Paternidade Crítica Filme Netflix Pôster

Sinopse: Em “Paternidade”, um pai cria sua filha como um pai solteiro após a morte inesperada de sua esposa, que morreu um dia após o nascimento de sua filha. Baseado em uma história real.
Direção: Paul Weitz
Título Original: Fatherhood (2021)
Gênero: Drama | Comédia
Duração: 1h 49min
País: EUA

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Receita para Reinventar

É provável que você termine a sessão da estreia de sexta-feira da Netflix se lembrando de um conjunto de filmes que tratam do mesmo assunto.  “Paternidade” tenta nos convencer com uma drama trazendo um rosto conhecido por papéis cômicos. Ele terá um grande desafio enquanto homem pela frente: cuidar de um bebê. Kevin Hart é a bola da vez no papel de Matt, que testemunha a morte súbita da esposa logo após o parto da filha, Maddy. Os amigos e a família, principalmente a sogra, colocam em dúvida a capacidade dele de tomar conta da menina sozinha. Afinal, motivos não faltam para tratar o protagonista pelo olhar da irresponsabilidade.

O longa-metragem se baseia no best-seller norte-americano “Two Kisses for Maddy“, do escritor Matt Logelin. Palestrante e ativista a partir de sua ONG The Liz Logelin Foundation, ele transformou esta necessidade de acolhimento a um núcleo familiar após uma perda trágica como missão de vida. Agora sua mensagem chega a um grupo maior de pessoas, em um lançamento mundial que marca a primeira distribuição da plataforma de streaming de uma produção da Columbia Pictures. É possível que a acessibilidade do verdadeiro Matt tenha sido fundamental para uma importante escolha de linguagem na obra. Ao não perseguir tanto a comédia em sua construção, o filme acerta na costura de uma relação que encontra suas dificuldades mesmo sem a oposição da sociedade.

Além disso, afugenta a ideia de romantizar a figura do pai solo, a despeito das cenas que exigem uma empatia a partir do que seria, digamos, sacrifícios. Sem um antagonismo demarcado, aqui todos os personagens são movidos por um desejo de que tudo dê certo, mesmo que isso exponha uma relação baseada na falta de confiança sobre Matt. O melodrama também não precisa se impor, já que algumas situações são capazes de ilustrar momentos-chave da relação entre pai e filha. A primeira delas acontece logo no velório de Liz, quando o discurso emocionado e pelo viés religioso do protagonista é interrompido pela realidade com o choro de Maddy.

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A partir daí, com uma formatação bem definida, as relações de causa e consequência bem delineadas trazem um bom ritmo a “Paternidade“. A culpa cristã e a aceitação dos desígnios divinos entram em conflito na maneira como Matt discorda da forma como a escola católica quer impor certas condutas à sua filha. Um flerte com o debate sobre heteronormatividade e o sistema binário que envolve decisões sobre peças de roupa que uma criança “tem que” usar, por exemplo.

Dirigido por Paul Weitz, que não acertava desde “Um Grande Garoto” (2002) – que o fez ser indicado ao Oscar por roteiro adaptado, o filme também possui créditos no roteiro para Dana Stevens, que teve como grande sucesso a adaptação de “Cidade dos Anjos” (1998), versão hollywoodiana de “Asas do Desejo” (1987). Um projeto difícil pela carga de preconceito de espectadores cansados de ver essa história se repetir. O trailer parece que nos fará refém da velha narrativa que explora um “outro lado” de um astro como Kevin Hart – mas há bem mais do que as gracinhas bobas que a obra sugestiona em sua abordagem.

Aos poucos, esta preocupação com a ausência de referencial feminino vai se estendendo a outros personagens, principalmente a avó da menina. Algo que não acontece, claro, quando uma mãe solo precisa cuidar sozinho da educação dos filhos por ausência do pai (motivada desde morte até o abandono consciente e cruel). Por óbvio, a presença de Hart garante a “Paternidade” algumas risadas, a comédia circunda sempre que possível o filme – e quase sempre baseada no clichê da gameficiação e competição de qualquer objetivo envolvendo homens no comando.

Porém, o que salta aos olhos é a irrevogável missão de Matt por não abdicar de qualquer aspecto da criação de Maddy. Ele não encara o futuro como um recomeço, sabe que isso o torna um pouco mais infeliz socialmente, mas desenvolve para si um conceito de justiça que o impede de ceder. Por mais que o bom humor dê o tom em algumas sequências, ficamos mais conectados com esta relação que parece não encontrar desafio grande o suficiente para abalá-la.

Paternidade” nos conquista por privilegiar as doses de humanidade, deixando as liberdades poéticas e os exageros ficcionais envolvendo coincidências do destino para trás – enquanto leituras ultrapassadas que são. Ganha ainda mais força em um ato final melancólico (mais do que apenas dramático), que torna a confirmação de tudo o que imaginávamos que aconteceria menos óbvia e, portanto, mais interessante. Sem perder tempo com exagerados diálogos edificantes ou sorrisos amarelos da velha piada da fralda suja, o longa-metragem parece pronto para agradar uma multidão. Depois de algumas experiências que não conseguem fugir da reprodução de clichês de dilemas familiares, parece um acerto deste catálogo que precisa conquistar a cada semana uma sequência de plays.

Veja o Trailer:

 

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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