Mostra Olhar do Ceará | Sessão 8 de Curtas

Cine Ceará Sessão 8 da Mostra Olhar do Ceará de Curtas

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Mostra Olhar do Ceará | Sessão 8 de Curtas

Aos que Ficam

Movimento Lucas Tomaz Neves Sessão 8 Cine Ceará
Movimento (Lucas Tomaz Neves)

A Sessão 8 da Mostra Olhar do Ceará encerrou o recorte regional online do 30º Cine Ceará. Com uma pluralidade que reflete o desejo de ampliar as possibilidades de linguagens e estéticas do audiovisual brasileiro, os três curtas-metragens finais têm um toque de resgate às origens, ao abordar a família como elemento central. Contudo, os jovens realizadores apresentam suas obras com uma busca pela originalidade e pela potência das imagens – exatamente o que a temática pedia.

Movimento” abriu a sessão. O filme de Lucas Tomaz Neves já havia sido objeto de análise na mostra competitiva de curtas nacionais do Festival É Tudo Verdade (leia esse texto clicando aqui). O diretor documenta a realidade de Lavras da Mangabeira, município onde moram seus avós. É a última exploração territorial, tão bem desempenhada nas produções da mostra. Além do que já foi dito na crítica original, chamou ainda mais atenção nessa revisitação, a exploração do som do rádio por quase metade da projeção. Há um senso comunitário, uma tentativa de recriar uma sociedade mesmo em face da solidão daquelas pessoas.

Plástico João Paulo Duarte Curta Cine Ceará
Plástico (João Paulo Duarte)

Até por isso, “Plástico” de João Paulo Duarte se destaca pelo contraste de espaços. O sertão cearense, da região do Cariri, se despede e dá lugar ao cinza e a urbanidade. Uma vida de plástico, com poucas cores disponíveis e anti naturalista. É assim que o cineasta compõe seu curta-metragem, desde cenários e figurinos até os poucos diálogos, pautados pelo exagero na declamação das falas. O pano de fundo é a maternidade renegada da protagonista. Uma preocupação com o choro constante do bebê, que vai se tornando motivo para questionamentos sobre sua capacidade de aguentar a situação.

Recém-viúva, ela carrega a culpa que a sociedade impõe às mães, que precisam amar sua prole, cumprir sua missão sacrossanta de embalar o futuro da Humanidade. É uma espécie de questionamento em cima do extremo, uma narrativa que possui saídas muito parecidas com o início empolgante da carreira de Xavier Dolan com “Eu Matei Minha Mãe” (2009).

Terceiro Dia Jéssica Queiroz Curta Cine Ceará
Terceiro Dia (Jéssica Queiroz)

É justamente do choro do bebê que a conexão com “Terceiro Dia“, da diretora Jéssica Queiroz, se desenha. O filme que encerra a apresentação dos 22 curtas-metragens (todos com comentários aqui na Apostila de Cinema) usa o recorte racial para mostrar a desigualdade de leituras e condições oriundas de determinadas situações. A protagonista parece iniciar um estado de puerpério, motivada pelas dificuldades que ela prevê enfrentar por ser uma jovem negra que acabou de ser mãe.

A cineasta, entretanto, reforça esse sentimento de solidão, de abandono. Fosse uma narrativa branca, estaríamos bem próximos de uma glamourização da maternidade adolescente, quase uma drama açucaradamente edificante como “A Criança” (2005), dos irmãos Dardenne. Mas, Verônica não é branca e nem está na Bélgica. Todas as que lhe antecederam lutaram essa luta sozinha e não há porque acreditar que com ela seria diferente. Com isso, ela sofre, se desespera. Se permite passar por isso, já que a sociedade não respeitará sua dor quando ela estiver com o filho entre os braços.

A Mostra Olhar do Ceará se encerra com essa poética da dor. Poéticas (e talvez exageradamente) foram também nossas análises, que sempre tentaram trazer um pouco de música para ampliar a experiência das sessões e deixa por fim um pouco do lirismo do sertão nos versos de Catulo da Paixão Cearense. Esperamos que os jovens realizadores, os projetos como o Verminosos por Futebol e o Cinema Instantâneo e todo mundo que contribuiu com essa seleção especial, continue a produzir e amplie a cena audiovisual cearense, ricamente representada na edição 2020 do festival.


Ficha Técnica da Sessão 8 de Curtas da Mostra Olhar do Ceará

Movimento (Lucas Tomaz Neves, 22′ – Brasil, 2019)
Sinopse: Ao acompanhar o reencontro de sua mãe com sua família após 33 anos separados, Lucas vivencia situações que se transformam em memórias ancestrais. Movimento é sobre o tempo, suas danças e conjunturas.
Plástico (João Paulo Duarte, 10′ – Brasil, 2020)
Sinopse: Luiza perdeu seu esposo num trágico acidente. De luto e sozinha, ela cuida de sua filha recém-nascida.
Terceiro Dia (Jéssica Queiroz, 10′ – Brasil, 2020)
Sinopse: Verônica, jovem negra e periférica de 18 anos, acaba de dar à luz ao seu primeiro filho. Desesperada e sozinha, ela não sabe o que fazer.

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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