A Colmeia

A Colmeia Filme Crítica Pôster

49º Festival de Gramado | ApostilaSinopse: Um grupo de imigrantes alemães vive em isolamento no interior do sul do Brasil. Ali eles são oprimidos pela eminência de agressores externos, mas também pela eminência da fome e do colapso da união do grupo.
Direção: Gilson Vargas
Título Original: A Colmeia (2019)
Gênero: Drama
Duração: 1h 41min
País: Brasil

A Colmeia Filme Crítica Imagem

Novas Babilônias

A segunda noite do 49º Festival de Cinema de Gramado se encerrou com mais um concorrente ao prêmio na mostra de longas-metragens gaúchos. Dirigido por Gilson Vargas, “A Colmeia” resgata o período da forte migração europeia à região Sul do Brasil, movida pela concessão de subsídios agrícolas por parte do Estado. Medidas que maquiavam os verdadeiros objetivos, o de praticar uma política higienista, com a intenção de agilizar o processo de embranquecimento da população.

Tanto que coincide com o período em que ocorreu no país o Primeiro Congresso Brasileiro de Eugenia, em suas teses racistas institucionalizadas com supostos embasamentos científicos neste encontro no ano de 1929. Uma das reações ao período nebuloso se deu com a Declaração Universal dos Direitos Humanos quase vinte anos depois, pela ONU – a mesma organização (e os mesmos direitos) que aquele conhecido que votou no atual Presidente hoje diz ser a causa de todos os males, veja bem.

Sabemos que o resultado foi a ampliação de uma sociedade injusta e provedora de ódio. A produção audiovisual contemporânea – em alinhamento com os avanços de pesquisas acadêmicas a partir da ocupação desses espaços por agentes por séculos silenciados – vem dando conta de trazer tais representações. Um exemplo se deu na noite anterior, com o documentário “Cavalo de Santo“. A ideia aqui é usar a ficcionalidade para mostrar como nem mesmo os responsáveis pelas mudanças culturais do período estavam livres de sofrimento e opressão.

O primeiro colapso é de Christoferr, um jovem que é impedido de seguir com os estudos porque, de acordo com o chefe da família, “precisamos de braços e não de cabeças“. A narrativa, que se alinha com o cinema da região nos últimos anos, usa a textura do suspense como forte elemento para nos mostrar o nascimento de uma nova cultura a partir daqueles novos donos de terra. Transforma-se, aos poucos, a vida do grupo em uma espécie de cárcere. Dali em diante, estaremos sempre cercados pelo risco de outros colapsos, tanto individuais quanto daquela frágil comunidade que se forma.

No meio de tudo isso, o Estado – se antecipando a um etnocídio provocado por ele mesmo – proíbe o uso de qualquer idioma que não seja o português. Contudo, este não é o único momento em que a despersonalização ganha contornos aterrorizantes em “A Colmeia”. No mais impactante, o corte forçado dos cabelos dos trabalhadores surge como uma marcação importante das relações de poder que estavam se formando. Vargas consegue dosar bem um filme que usa o sombrio e a expectativa do fantástico, mas é totalmente mundano.

De política higienista a uma torre de babel acidental, se tornando mais um regime opressor de classes. Mais um capítulo da história do Brasil revisitada por uma obra cinematográfica que usa bem o contexto e a estética de uma época que dá ao passado ares de presente.

A Colmeia” pode não ir tanto além da construção de expectativa para aqueles que desejam arrebatamentos. Para quem internaliza a atmosfera sufocante, aqui está uma opção para nos provocar e perturbar sem que o terror não se concretize enquanto imagem. Afinal, ele já existe em nós enquanto ideia.

Veja o Trailer:

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

1 Comment

  1. Hoje 31/07 assistimos ao filme na aconchegante Cinemateca Capitólio. De fato um filme onde o suspense é a tônica, e a dureza e intôlerância remetem ao petardo “A Fita Branca”. Embora sem um final arrebatador, o enredo nos prende e aflige. Tua resenha é deveras assertiva, parabéns.

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