O Novelo

O Novelo Filme Crítica Pôster

Sinopse: Cinco irmãos acabam sendo criados pelo irmão mais velho, após a morte da mãe. Um dia, já adultos, eles recebem a notícia de que um homem em coma numa UTI pode ser seu pai. Na sala de espera do Hospital os irmãos mergulham em seus conflitos e memórias e, através do tricô aprendido na infância.
Direção: Claudia Pinheiro
Título Original: O Novelo (2021)
Gênero: Drama
Duração: 1h 35min
País: Brasil

O Novelo Filme Crítica Imagem

Pelo Fim da Irmandade Tóxica 

Dirigido por Claudia Pinheiro, “O Novelo” é daqueles filmes que se encaixam bem com o Festival de Cinema de Gramado, onde foi apresentado na noite deste domingo. Rostos conhecidos no elenco e uma narrativa tradicional, que traz questões contemporâneas de nossa sociedade de forma tabelar, sem perder o ritmo de uma boa história. O longa-metragem, concorrente aos Kikitos da mostra nacional, possui um forte apelo de público e nos coloca no meio de uma situação: cinco irmãos na emergência de um hospital, sem saber se homem internado em coma no CTI é seu pai.

Para chegarmos a esta dúvida, o roteiro de Nanna de Castro, adaptando sua dramaturgia, nos leva ao passado daquele grupo, em que suas particularidades e os reflexos dela na relação com o pai serão exploradas. Nas possibilidades que uma obra audiovisual de longa duração permite, o caminho aqui não é tão direto. Os arcos daqueles homens surgem separados, sem o excesso de verbalização típica das artes cênicas. Mostrando enquanto pessoas múltiplas, tanto na relação de suas carreiras, sexualidade e forma de se relacionar com a família, o primeiro grande novelo está na própria linguagem do filme.

Com as participações especiais de André Ramiro e Isabel Zuaá na figura dos pais dos meninos, a fase adulta deles é defendida por um elenco impressionante, que distribui seus talentos de forma equilibrada, em uma química prazerosa em cena. Nando Cunha, de tantos papéis cômicos, cada vez mais se firma como um ótimo ator dramático, se unindo a Sidney Santiago (destaque desde “Diamante, o Bailarina“); Rocco Pitanga e Sérgio Menezes (ambos de muita experiência na TV, mas com poucos trabalhos no cinema) e Rogério Brito (de forte vivência no teatro e cada vez mais presente nas telas).

Mais do que bons personagens para esse leque de atores, “O Novelo” traz a masculinidade tóxica para o centro do debate, sem forçar heroísmos ou antagonismos atravessados. Trata de da luta contra o vício em drogas legalizadas e seu impacto na relação com os filhos a partir de Cicinho e deixa lacunas a serem preenchidas pelas nossas percepções em relação à forma como João, um rapaz homossexual, foi tratado pelos entes queridos quando mais precisou de acolhimento. Apenas uma tradição os une: o hábito do tricô, desenvolvido em casa na infância.

Assim como Regina King em “Uma Noite em Miami…” (2020), estamos diante de uma obra dirigida por uma cineasta que vai fundo no universo masculino. Sem os nomes fortes das personalidades norte-americanas, mas com o peso de uma união afetiva e sanguínea que só nossos corações latinos conseguem compreender em sua totalidade.

Enquanto pano de fundo as consequências de nossa formação e dos vínculos de afeto permanecem, mesmo quando estamos afastados. Claudia Pinheiro faz bem essa abordagem panorâmica com um toque de permanência, como se as sequências chegassem a nós como relatos do cotidiano, na parte inicial. Quando a narrativa, tal qual uma embarcação, ancora no mistério sobre a identidade do homem internado, o filme ganha rodagem, amplia nosso interesse e desenvolve bem os elementos de conexão dos protagonistas.

Sempre haverá espaço para rancor e amargura e todos aqueles que tem ou já tiveram problemas familiares sabem que as formas de superar os traumas do passado precisam ser criadas – ou a vida passa e a mágoa permanece. Até por isso, é curiosa a maneira como a história assume que já houve derrota diante do tempo perdido, em que aqueles irmãos deixaram o orgulho falar mais alto. Assim como o restante de “O Novelo“, seu trecho final funciona muito bem, dá à conclusão outras possibilidades de leitura – e uma mensagem para além da ótima experiência de assistir ao longa-metragem.

Em virtude do que a sociedade espera de Zeca, Mauro, João, Cicinho e Cacau enquanto homens, era de se imaginar que suas relações – ao longo dos anos – sofressem abalo. Diante disso, entender o significado de irmandade e de família – entre si e dos outros – é fundamental para que os danos causados pelo passado sejam recuperáveis.

Veja o Trailer:

Clique aqui e acompanhe nossa cobertura completa do Festival de Gramado 2021.

Clique aqui e visite a página oficial do evento.

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *