Bebês do Futuro

Bebês do Futuro

Sinopse: O que começou como uma tentativa de ajudar casais inférteis a terem filhos é hoje um lucrativo negócio de ‘bebês industrializados’. As esperanças e desejos de futuros pais se misturam com pesquisas e uma tecnologia que aperfeiçoa embriões ao selecionar os genes mais desejáveis a dedo. “Bebês do Futuro” nos leva a pacientes, pesquisadores, doadores de óvulos, mães de aluguel, clínicas e laboratórios, e nos faz perguntar: quão longe queremos ir?
Direção: Maria Arlamovsky
Título Original: Wie Weit Wollen Wir Gehen? (2016)
Duração: 1h 31min
Gênero: Documentário
País: Áustria

Bebês do Futuro

Reproduzindo Informação

Bebês do Futuro” fez parte da reta final da extensa oferta de documentários da 9ª Mostra Ecofalante de Cinema. Todos com assuntos carregados de pertinência sobre a sociedade moderna, despertaram interesse e deram prazer à nossa equipe em produzir textos críticos. Talvez o filme austríaco dirigido por Maria Arlamovsky seja o único que revelou ser uma experiência um pouco mais cansativa, se aproximando de uma grande aula sobre seu objeto, qual seja, as modernas técnicas de inseminação e manipulação genética.

Com um grande leque de relatos, os testemunhos são pouco aproveitados. Mulheres (e alguns homens) partilham suas experiências sobre maternidade, paternidade e a doação de material genético apenas como ligeira introdução para que um linguajar mais técnico e representações laboratoriais ganhem espaço. Não que falta espaço para o debate ético acerca do tema, mas ele não se sobrepõe em nenhum momento. Portanto, trata-se de um longa-metragem mais indicado para quem deseja saber mais sobre os processos de fertilização, criogenia e todo o processo médico sobre o assunto.

De início, “Bebês do Futuro” dava a impressão de construir uma carga mais humanitária em sua condução. Entrevista uma mulher de 49 anos de idade que tentará ser mãe por um processo de inseminação artificial. Ela nos lembra que a sociedade estabelece como uma meta física (separado mesmo) os 35 para uma mulher ser mãe “naturalmente”. Ignoram que desde 1978 (ou seja, mais de 40 anos) uma expressão de popularizava no mundo: o bebê de proveta. As novas gerações já se habituaram a termos mais técnicos, mas ainda paira sobre nós a defesa de uma opinião anticientífica de limitação de atuação.

Isso impacta diretamente a chamada liberdade reprodutiva das mulheres. Por mais que algumas décadas tenham se passado e a tecnologia permitiu novas formas de atingirmos a maternidade, ainda há um peso ético sobre a decisão – como se fosse algo coletivo, quando é óbvio que se trata de uma escolha individual delas. Um exemplo foi uma notícia veiculada há um mês. Gloria Perez, em meados da década de 1980 queria, na esteira dessa nova forma de reprodução, escrever uma novela em que uma personagem permitia que o filho de outra fosse gerado em seu frente. Hoje sabemos que essa ideia de roteiro se tornou, em 1990, “Barriga de Aluguel“. Porém, passados trinta anos de sua estreia, ela contou que saiu da TV Globo por não concordar com a intenção original do canal, que imaginava essa trama como algo ficcional, quase futurista. Gloria insistiu que – assim como boa parte de seus trabalhos – a ambientação fosse dentro da sociedade da época. De volta à rede, teve seu sucesso reconhecido a ponto de, em 2002, fazer “O Clone” – aqui, sim, uma possibilidade muito remota de avanço tecnológico.

Essa maneira de reprimir o corpo das mulheres talvez tenham evitado o avanço em algumas questões sobre o filme. Desperta interesse – mas não se aprofunda – formas como se desenvolveu um “turismo de fertilidade”, em países com legislações menos rígidas sobre tratamentos. No Brasil, por exemplo, uma lei de 2013 flexibilizou as possibilidades da já citada barriga de aluguel. Se destaca, também, a maneira globalizada que aproxima a reprodução assistida de outras produções complexas, assunto que tratamos em outro filme do festival, chamado “O Custo do Transporte Global” (2016) Também ficamos à deriva em casos como o direito de buscar informações sobre a mãe biológica e o inverso das decisões que partem das mulheres, com o direito à paternidade solo.

O caminho que “Bebês do Futuro” mais se aprofunda é sobre a decisão dos pais de não serem informados sobre o histórico dos doadores – uma escolha que pode gerar complicações mais adiante, com a possibilidade de problemas congênitos manifestados logo após o parto até mesmo no curso da gestação. Só que há uma linha tênue entre o uso desta informação e a manipulação genética, o que talvez seja o tema mais espinhoso que o documentário poderia trazer. Porém, se valendo de uma maneira pouco dinâmica de abordagem, encerra-se a sessão com a sensação de criação de uma nuvem de tags sem que pudéssemos chegar a muitas conclusões.

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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