Sinopse: Depois de um trágico acidente de carro na Grécia, o turista americano Beckett se envolve em uma perigosa conspiração política e precisa lutar para salvar a própria vida.
Direção: Ferdinando Cito Filomarino
Título Original: Beckett (2021)
Gênero: Thriller | Ação | Aventura
Duração: 1h 49min
País: Itália | Brasil | Grécia
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A produção globalizada “Beckett“, com ares de Nova Hollywood, mas uma coprodução que envolve Itália, Grécia e o Brasil (pela RT Features), se apresenta com um ar de clássico filme de fuga, com boa performance do ator John David Washington, que vai se consolidando como um dos melhores do momento, após se destacar em “Infiltrado na Klan” (2018), e “Tenet” (2020).
Por sinal, na abordagem inicial parecia que assistiríamos algo próximo da viagem de Christopher Nolan. O protagonista aparece na cama com a namorada April (Alicia Vikander). Na cabeceira, a anotação em um papel pergunta o que disso o oráculo? Na verdade, o caso está de férias na Grécia da década passada, atraente para os turistas a oeste da Europa e dos Estados Unidos, com valorizadas divisas frente a um país em crise carregado de História e sedento por receita de seus visitantes. Em uma das viagens de carro, eles se acidentam e Beckett acorda em um hospital sem saber o que aconteceu com April.
Não bastasse os desafios do idioma e o ranço do racismo estrutural, o personagem começa a ser perseguido, como se estivesse metido em um caroço de angu bem mais complicado do que parece. Dali em diante, “Beckett” se transforma em uma obra que usa as poucas informações de seu protagonista e do público para criar uma ação intensa envolvendo a perseguição e a busca por explicações. O diretor Ferdinando Cito Filomarino, em seu segundo longa-metragem bebe da fonte clássica do gênero. Não de reproduções saudosistas de cenas e sim como um maneirismo estético que cai bem em uma narrativa que parece sempre a um passo de se tornar genérica (como acontece nas incontáveis estreias de streaming toda semana).
Por sinal, “Beckett” chega hoje com exclusividade ao catálogo da Netflix após exibição especial na 74ª edição do Festival de Locarno. Foi adquirido pela plataforma como o primeiro “original grego”, depois que a pandemia de covid-19 levou a uma desistência de seus realizadores em estrear no circuito – e que ainda possuía o nome espetacularmente saudosista de “Born to be Murdered” ou, em tradução livre, “Nascido para Morrer”.
Com um rosto conhecido no elenco e sem muitos concorrentes, deve atrair uma grande parte das atenções de seus assinantes. Sua abordagem direta, com todos os cacoetes de um cinema norte-americano dos anos 1960 e 70, – ainda fixado nas mentes cinéfilas – nos remete aos primeiros trabalhos de John Boorman, como “À Queima-Roupa” (1967) e “Amargo Pesadelo” (1972) e que ao longo do tempo foi sugado enquanto modo de fazer, em um crescendo.
A amplitude visual que Filomarino dá aos planos, com lentes que dão nitidez total às paisagens gregas, é outro elemento que cria essa proximidade. Por vezes parece até que a película foi utilizada. Nas cenas realizadas na estrada para Kalamata, de descida sinuosa, o território gigante torna ainda mais assustadora aquela fuga. Um filme que sabe usar seus elementos escondidos ou incompreendidos – tanto na história quanto nas imagens – como personagem. Uma caçada que nos instiga, nos faz ir além, sem que o ritmo do thriller caia em nenhum momento. O primeiro roteiro de Kevin A. Rice não demanda complexidade e se aproveita da boa utilização do diretor.
A segunda metade adiciona um tempero de trama política, o que faz o filme dialogar com outro lançamento da semana, “Jogo do Poder“. Quem diria que o veterano Costa-Gavras reencontraria uma fita de ação com áurea hollywoodiana em pleno 2021? Coisas que a junção entre algoritmos que condicionam produções, público saudosista e realizadores dispostos a revisitar formas clássicas em seus expedientes maneiristas permitem. Apesar de, em nossa crítica à obra do grego, celebrarmos a maneira como ele atualiza suas abordagens.
É possível que o roteiro de Rice beba da fonte do contexto histórico trazido pelo próprio Gavras no outro filme – e um dos indicativos é a inclusão de uma fotografia de Barack Obama enquanto Presidente. Não apenas uma demarcação de tempo, mas uma forma de sintetizar pelo olhar de Washington parte das dificuldades encaradas – para além dos actions heroes brancos de outros tempos.
Por fim, em uma cena de luta corporal na plataforma de metrô, os cortes de montagem de Walter Fasano (o mesmo de “Me Chame Pelo Seu Nome” e “Suspiria: A Dança do Medo”, também produzidos por Rodrigo Teixeira) também remete ao Cinema do período já mencionado – o que torna tudo mais próximo de um comfort movie para o final de semana. Se você quer matar as saudades de bons dramas políticos, siga a estrada grega de Costa-Gavras. Se você prefere uma ação “classuda”, pegue o caminho que vem da Itália nesse thriller spaghetti improvável que “Beckett” nos proporciona.
Veja o Trailer: