Leia a crítica de “Instinto Assassino”, suspense estrelado por Scott Eastwood, que chegou esta semana na Netflix.
Sinopse: Em “Instinto Assassino”, um sociopata reformado vai para uma ilha remota após a morte de seu irmão. Logo após sua chegada, a ilha cai sob o cerco de uma gangue mortal de mercenários, e quando ele descobre seu papel na morte de seu irmão, ele parte em uma busca implacável por vingança.
Direção: David Hackl
Título Original: Dangerous (2021)
Gênero: Ação | Suspense
Duração: 1h 39min
País: EUA
Sopa no Mel
Se tem algo que não gosto de fazer ao término de um filme é realizar um exercício de projeção que o defina como uma obra “esquecível”. Talvez “Instinto Assassino” seja uma das produções mais desafiadoras nesse sentido. Um dos principais lançamentos da plataforma de streaming Netflix desta semana, o suspense protagonizado por Scott Eastwood (filho de Clint) é tão convencional que parte do espectadores – mesmo sem nenhuma atualização do sistema cerebral que permita ler os algoritmos da empresa – sabe o que vai acontecer.
Por isso que acho curiosa a maneira como alguns desabonam longas-metragens como “No Ritmo do Coração“, vencedor do Oscar de melhor filme de 2022, por exemplo. Ali temos uma narrativa que resgata boa parte dos clichês de filmes de adolescente e complexificam uma protagonista e uma gama de personagens em seu entorno que trazem outras questões (e representatividade) para a trama. Aqueles que atacaram “CODA” devem estar se perguntando em que gaveta de nossas memórias se encaixa esse filme aqui.
O roteiro de Christopher Borrelli, que possui outras histórias de ação no seu currículo, nos apresenta Dylan, um rapaz em processo de reinserção social. Com transtorno de personalidade antissocial, ele não é capaz de desenvolver qualquer empatia ou sentir a dor do outro, o que o torna uma pessoa cruel. Após cumprir penas por seus crimes, ele precisa se tratar – e o faz com o Dr. Alderwood (Mel Gibson) – para que possa reencontrar família e amigos. Eles, principalmente sua mãe, abandonaram qualquer desejo de dar ao homem uma segunda chance, como se inverte o olhar em relação ao lançamento da semana do Telecine, “Stillwater“.
O que movimenta “Instinto Assassino” é a notícia da morte do irmão de Dylan. Isso adianta o processo de reencontro com os parentes, em uma reinserção forçada no velório. Ao observar marcas e cortes estranhos no corpo da vítima, ele desconfia que está diante de um assassinato. Quando um grupo de bandidos, liderado por Cole (Kevin Durand) chega à ilha comprada pela família, o personagem de Eastwood vira um exército de um homem só, passeando entre a vingança e a violência inerente à sua personalidade.
A diferença aparente do longa-metragem é que Dylan precisa se entender nessa espécie de psicopatia. Comprometido a não responder de forma agressiva, ele se socorre algumas vezes com o médico por telefone. Gibson ganha um dos salários mais fáceis da sua carreira, em cenas curtas e solitárias que não devem ter demandado mais do que duas diárias. Tanto que ele já assinou contrato para uma continuação. Mesmo assim, sua imagem em todo o material de divulgação deve ter sido uma dos responsáveis por colocar a obra no topo das mais assistidas da Netflix nas primeiras horas de lançamento no Brasil (e, sem dúvida, em boa parte do mundo).
Os três atos demarcados do filme deixam o público em total zona de conforto. O primeiro terço para a introdução e a apresentação do conflito, o segundo no qual o protagonista é atacado e precisa entender aquelas motivações – em um ritmo mais carregado de ação – e o terceiro que, diminuindo a voltagem para ir além da matança, começa com a revelação e termina com um clímax violento. Dylan está disposto a se expor para proteger a família, mesmo sem receber acolhimento em troca. Mais uma narrativa que sai da espinha dorsal bem-sucedida desde “Duro de Matar” (1988) e que sempre chegou às nossas casas para movimentar o final de semana dos cinéfilos.
É possível que a forma como consumimos essas obras hoje ajudem a aumentar essa sensação de “esquecibilidade”. Antes eram dois processos: ou chegava pela televisão, nas sessões de sexta e sábado à noite dos canais abertos ou fechados; ou dependia de nossa locação dos VHS e DVDs. O segundo exigia um mínimo grau de curadoria e o primeiro era o resultado de uma oferta bem menor de produções. O que os streamings fizeram foi criar um congestionamento de filmes tão parecidos que suas características genéricas saltam aos olhos.
Mesmo assim, sempre há uma cena para comentar com os amigos, geralmente as mais absurdas. Uma delas é quando Dylan precisa confirmar com Alderwood por telefone que a resposta violenta pode ser uma exceção quando sofremos um atentado contra a própria vida. Outra pode ser a revelação dantesca sobre o que o irmão do protagonista escondia e fez um grupo de criminosos ficarem em seu encalço – e aqui havia uma premissa promissora sobre um tesouro histórico que vira mera muleta narrativa.
Ou talvez eu tenha trazido esses exemplos apenas para extrair do fundo da minha memória o que acontece em “Instinto Assassino” quando retornar a essa crítica sem lembrar muita coisa. Isso pode acontecer daqui a um ano ou uma semana. Pensando bem, melhor revisar rápido o texto antes que eu não reconheça minhas próprias palavras.
Veja o Trailer: