Sinopse: Após ser envenenada de forma irreversível, uma assassina implacável tem menos de 24 horas para se vingar.
Direção: Cedric Nicolas-Troyan
Título Original: Kate (2021)
Gênero: Ação | Thriller | Crime
Duração: 1h 46min
País: EUA
Filmes Genéricos | Sem Título #542247
Meu amor, o que você faria se só te restasse um dia? Antes que você pense que farei com a crítica de “Kate” algo parecido com a de “Céu Vermelho-Sangue” (2021) – em que usei os versos inesquecíveis de Tchakabum para troçar com o esquecível filme alemão – a menção ao clássico mpbístico de (Paulinho) Moska é apenas para mostrar que não parecia tão fundamental assim a missão da protagonista vivida por Mary Elizabeth Winstead. Consciente de que não sobreviveria para assistir ao próximo nascer do sol, ela brinda o assinante da Netflix com uma busca desenfreada por justiça/vingança contra aqueles que articularem de forma eficiente sua morte.
Retomando o que mencionamos no texto sobre “Caça Invisível“, a produção dirigida por Cedric Nicolas-Troyan é mais um exercício de plot que não rende muito mais do que a sacadinha que o forjou. Até que ele se esforça, em conjunto com o design de produção do experiente Dominic Watkins. Tenta alinhar referências começando estética suja e ultraviolenta bem recebida em criações modernas, desde “John Wick: Um Novo Dia para Matar” (2017) à versão destruidora de infância dos nerds puristas de “Tomb Raider: A Origem” (2018) (cada exemplo em seu grau de representação, antes que me acuse de misturar estações). Une a linguagem contemporânea do neon com a mistura de artes marciais e urbanismo que remete a “Massacre no Bairro Japonês” (1991) – e lá se vão três décadas da reunião de Brandon Lee e Dolph Lundgren.
A Netflix se tornou a pedra no sapato de quem aponta maneirismo em cada frame porque nem sempre conseguimos segmentar o que há de genérico, referencial enquanto premissa, enquanto forma ou apenas um leitura algoritmizada. Muito se fala das construções herméticas e limitadoras de criatividade da Marvel com seus realizadores, mas – à exceção de obras como “Roma” (2018), “O Irlandês” (2019) e “Mank” (2020), projetos de vida de cineastas consagrados – é comum permanecermos na dúvida sobre o que há de autoral e as intenções por trás do trabalho do francês, em seu segundo longa-metragem.
Ele, que vem do mundo dos efeitos visuais e pelo qual conseguiu até uma indicação ao Oscar em 2013 por “Branca de Neve e o Caçador” (2012) (ao lado de Watkins) não parece tão disposto a imprimir o virtuosismo estético como poderíamos imaginar vindo de alguém que migra deste setor. Ou talvez há uma limitação – não orçamentária – mas de abordagem pelas mãos dos produtores envolvidos aqui. Usando como base o roteiro do novato Umair Aleem, é possível imaginar que Cedric teria um prato fundo em self-service sem balança e poderia montar o que quisesse. Só que ele pega arroz, feijão, um bife e batata frita.
Talvez seja difícil chegar ao final da crítica de “Kate” sem tomar um café para tapear a fome depois da comparação acima. Entretanto, não há outra maneira de reiterar que a obra reproduz expressões do gênero, entrega desde logo o que ela quer que o espectador “finja que não viu” para que seu terço final tenha a sensação de virada de trama. Winstead, que será Ramona para todos que curtem “Scott Pilgrim Contra o Mundo” (2010) prova que consegue segurar o protagonismo de um filme de ação – depois de ser a Caçadora de “Aves de Rapina” (2020). Enquanto que Woody Harrelson faz aquele trabalho que o iguala a Nicolas Cage e Robert De Niro de atores que ou são viciados em atuar ou nunca conseguem dar conta de seus boletos.
A partir dela a personagem-título vive seus meses de remorso por uma missão não tão bem-sucedida em Osaka. Já em Tóquio, ela está disposta a concluir o plano a qual lhe foi conferido, mesmo com a morte batendo sua porta. Logo ela, que – assim como dezenas de outros actions heroes do cinema norte-americano – está pronta para se aposentar depois daquela missão. Na caça por Kijima (Jun Kunimura), que revelará uma disputa de poder paraestatal na velha narrativa de máfia, ela sequestrará Ani (Miku Patricia Martineau) e com ela encontrará uma espécie de aliada que servirá de conforto para suas últimas horas, por que não?
“Kate” é uma sequência de perseguições, explosões, tiros e o kung fu que sai da lógica de Steven Seagal e dialoga com o protagonismo disposto a chorar sangue em seu intento. Na onda de clichês que o define, mostra que boa parte dos justiceiros se revelam ferramentas, instrumentos manobrados por um sistema que os usa como máquina de matar. Aliás, desde os anos 1980 essa vibe “comandado para matar” está por aí. Vai ser difícil não recorrer a essas anotações quando tentar me lembrar do longa-metragem daqui a alguns dias. Ou algumas horas. O filme morrerá nas minhas memórias. E, ao contrário de Kate, não será um morte com estilo.
Veja o Trailer: