Leia a crítica do sucesso brasileiro “Marte Um”.
Sinopse: A família Martins é sonhadora e otimista, vivendo tranquilamente nas margens de uma grande cidade brasileira após a decepcionante posse de um presidente extremista de extrema-direita. Uma família negra de classe média baixa, eles sentem a tensão de sua nova realidade enquanto a poeira política baixa. Tércia, a mãe, reinterpreta seu mundo depois que um encontro inesperado a deixa se perguntando se ela é amaldiçoada. Seu marido, Wellington, coloca todas as suas esperanças na carreira de seu filho, Deivinho, que relutantemente segue as ambições de seu pai, apesar de secretamente aspirar a estudar astrofísica e colonizar Marte. Enquanto isso, sua filha mais velha, Eunice, se apaixona por uma jovem de espírito livre e pondera se é hora de sair de casa.
Direção: Gabriel Martins
Título Original: Marte Um (2022)
Gênero: Drama
Duração: 1h 55min
País: Brasil
O Espaço é Aqui
Demorar para escrever sobre “Marte Um” tem a ver com o tempo que ele precisou para assentar por aqui. São muitas as questões que Gabriel Martins se propõe a pensar no longa-metragem. Essa poderia ser uma armadilha para o diretor, no entanto, o que vemos é um filme sensível que não se fecha em si mesmo, mas dialoga com o espectador o tempo inteiro. As sequências e histórias são convites a se pensar a construção contemporânea do Brasil. Do país que temos e daquele que desejamos.
Assim, a produção brasileira que, na esteira da indicação para representar o país na edição de 2023 do Oscar, superou o preconceito e a desconfiança do exibidor nacional e acaba de atingir 50 mil espectadores nos cinemas, abre uma série de feridas que não pretende fechar, mas trazer à tona. Dando protagonismo a cada uma das personagens de um núcleo familiar composto por negros de classe média baixa, conversa com grande parte da população buscando conexões entre gerações e possibilidades de encontros entre as mesmas.
O que move a narrativa de “Marte Um” são esses encontros com suas belezas e seus ruídos. Desde a escolha musical para uma das sequências principais de Eunice (Camila Damião), até o jeito tímido de Deivid (Cícero Lucas), tudo nos leva a um tempo de estações mescladas.
O fato de ser originário do primeiro edital para negros do audiovisual no Brasil (Longa BO Afirmativo 2016) não é menor e precisa ser ressaltado. Em uma época na qual o cinema nacional vê suas possibilidades de feitura desmoronarem, é essencial lembrar por meios concretos o que somos capazes de realizar com verba. Lembramos que “Um Dia com Jerusa”, de Viviane Ferreira, e “Cabeça de Nêgo”, de Déo Cardoso também foram realizados por conta do mesmo edital.
A beleza da obra ultrapassa a tela e os corpos de Eunice, “Deivinho”, Tércia (Rejane Faria) e Welligton (Carlos Francisco). A possibilidade de sonhar com outros lugares, cotidianos, espaços e profissões transborda em cada uma das histórias. Os integrantes da família da periferia de Contagem, aparecem aqui com sonhos que poderiam ser de cada um de nós. Que são de cada um de nós.
A última sequência, nos faz mergulhar em “Marte Um” e submergir vagarosamente. Diversas vezes somos rememorados que a ficção se passa em uma realidade imediata às eleições de 2018. Não por acaso, há uma tensão que pode ser sentida. É lindo ver que justo esse ano, o filme escolhido para representar o Brasil no Oscar seja esse, tão cheio das particularidades nacionais. Que ele nos ajude a enxergar uma realidade mais cheia de ação e do sonhar. Porque precisamos dos dois.
Veja o Trailer: