Pegando a Estrada

Pegando a Estrada Filme Crítica Poster

45ª Mostra SP LogoSinopse: Em “Pegando a Estrada”, uma família caótica e afetuosa viaja por uma paisagem acidentada, mas para onde? No banco de trás, o pai parece estar com uma perna quebrada, mas ela está realmente quebrada? A mãe tenta rir ao mesmo tempo em que não consegue conter as lágrimas. O filho mais novo fica agitado no karaokê coreografado que fazem no carro. Todos eles estão preocupados com o cachorro doente e irritando uns aos outros. Apenas o misterioso irmão mais velho permanece quieto.
Direção: Panah Panahi
Título Original: Jaddeh Khaki (2021)
Gênero: Comédia | Drama
Duração: 1h 33min
País: Irã

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Chamando o Seguro

Um dos representantes do sempre apaixonante cinema iraniano na Competição Novos Diretores da 45ª Mostra SP, “Pegando a Estrada” conta a história de uma família formada por pessoas espirituosas que, entretanto, não se compreendem. Como acontece nas melhores do gênero, suas opiniões e recortes geracionais mantêm um clima de tensão nas relações. O diretor Panah Panahi exibiu a produção na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes deste ano. Filho de Jafar Panahi, de grandes obras contemporâneas como “Táxi Teerã” (2015) e “Três Faces” (2018) – o segundo montado por aquele, seu longa-metragem de estreia mostra que ele não terá dificuldades em se consolidar nesse tipo de narrativa que tanto agrada aos festivais.

Até porque ele constrói a história com elementos simples, usando de forma típica esse tipo de ambientação. Diálogos com frases de efeitos, como aquele que abre o filme e é formado pela pergunta “onde estamos?” no que é respondido “estamos mortos“. Uma viagem de carro em família costuma trazer essa inquietude de ter que conviver mais de perto com entes tão queridos, sem muitas opções de fuga. Piora quando o veículo precisa do socorro da seguradora, deixando todos em compasso de espera. Por isso é justificável a pequena revolta que se instala no som daquela estática que antecipa que um telefone celular irá tocar ou notificar algum aplicativo.

Porém, por trás desse cenário habitual, as camadas que encontramos também são corriqueiras. O pai (Hasan Majuni) e a mãe (Pantea Panahiha), na verdade, observam o filho mais velho (Amin Simiar) em processo de saída do ninho. O garoto é bem mais reservado do que o irmão (Rayan Sarlak), traz uma sensação de que vive o fim de um ciclo. Um momento que muitos de nós entendemos emblemático, já que nossos pais precisam parar de nos interpretar como crianças. Só assim romperemos com a ideia de que eles não compreendem o que estamos vivendo com a chegada da fase adulta.

Em “Pegando a Estrada” isso aparece das formas mais singelas possíveis. Seja no olhar da mãe que parece analisar e refletir os passos do filho, até o pai que oferece (ou aceita) dividir com o garoto um cigarro. São movimentações que trazem respeito e ao mesmo tempo despressuriza a mente de quem acha que os filhos serão eternas crianças. O fim da era da vulnerabilidade, da dependência, que tanto aguardamos, mas surge sem que possamos nos acostumar a ela. O que os novos entendem como evolução para os mais velhos é uma transformação. Não devemos esquecer que o voo solo daquele menino é, por outro lado, a percepção de envelhecimento do pai e da mãe.

Envelhecer e perecer e se confrontar com a finitude da vida. Além de assistir no ser que era levado por nós alguém que consegue se movimentar sozinho – e, provavelmente, cuidará da gente no futuro. Uma marca visual do filme é mostrar o personagem de Majuni usando um gesso na perna colocado há quatro meses. Em volta dessa informação, as chances dele falsear a necessidade desse adereço são grandes. Talvez o objetivo seja não encarar outras questões que ele pode desviar com essa desculpa.

Depois do primeiro terço de estabelecimento de narrativa, o ato seguinte do longa-metragem se desdobra através dos diálogos. Em campo mais aberto, a mecânica das cenas traz uma relação bonita de afastamento do filho, com planos longos, explorando visualmente a história ao mesmo tempo em que ela se torna mais íntima. O irmão mais novo, tão espirituoso, vai deixando de ser um agente esperto para recuperar sua inocência e os pais começam a admitir ao mais velho que são movidos pela mistura de emoções conflitantes.

Com um ritmo que nos emociona paulatinamente, “Pegando a Estrada” resgata aquele momento de nossas trajetórias que soa confuso e depois faz todo o sentido. É o do distanciamento daquele núcleo que chamamos de família, para nossa criação de asas. Seja pela revolta adolescente, pela briga ou pela passividade, não importa. Mais adiante percebemos que esse distanciamento, na verdade, nos aproximou. Deixamos de ser dependentes para virarmos cúmplices. Um olhar de respeito de quem sabe que somos, por fim, adultos – e continuamos com medo de viver.

Veja o Trailer:

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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