Programa Personagem de Cinema | Parte I
De Quantos Risos Vive o Cinema?
A Mostra Cinemas do Brasil exalta em um de seus programas aqueles que estão mais do que detrás das câmeras. Não estamos falando dos profissionais da área, que, a depender de sua função, também não são tão valorizados quanto deveriam. Falamos, sim, daqueles que possibilitam que a experiência chegue ao seu fim: o espectador. Por isso, o Programa Personagem de Cinema se torna uma compilação de homenagens aos que estão no último elo da cadeia. Assim como fizemos com o Programa Quando a Sala Vira Projeção, iremos dividi-lo em duas partes.
A sessão começa com “Baú do Zuzu“, filme em que Raul Ribeiro assina direção, produção, roteiro, narração, câmera, sonoplastia, montagem e finalização. Apesar do olhar ser de Ribeiro, é Zuzu quem ganha protagonismo. Raul nos conta sobre o único cinema que existia na cidade de Brumado, no Estado da Bahia, em sua infância. Todavia, esse é apenas um pretexto.
Assim, o jovem faz uma arqueologia de outros cinemas que haviam se instaurado na pequena cidade, como os Cine Teatro Fátima e do Cine Teatro Regina, esses da época de seus pais e avós. Nosso protagonista Zuzu aparece nesse momento como antigo responsável por essas salas. O encontro de gerações se dá mediado pela família de Ribeiro, que relembra diversos momentos de descontração nos cinemas De maneira divertida, o diretor envolve quase toda a família na investigação. O tio-avô , José de Souza Ribeiro, o famoso Zuzu é apresentado por todas essas vozes.
Estudante de cinema, Raul faz um filme sobre vários tempos dessa manifestação artística e de sua própria família. Talvez, ávido por guardar as memórias que ainda restam daqueles espaços, de Zuzu e de sua própria história.
Já em “O Fantasma de Glauber Rocha“, o realizador L. H. Girarde constrói um programa no estilo do antigo “Aqui Agora”, comandado pelo saudoso Gil Gomes. O programa na ficção se chamado Lendas Diretas: Mistério, narra o aparecimento de Glauber Rocha em Vitória da Conquista, sua cidade-natal. Com muita ironia, o curta-metragem por vezes lembra as obras ácidas de Guerreiro do Divino Amor, artista plástico que utiliza muito bem as distopias para fazer uma crítica social.
Embora o filme não seja tão incisivo nesse sentido, a própria figura de Glauber carrega um teor político em si. O filme pode sugerir ser necessário nos libertar dos fantasmas que ainda nos perseguem. Quem sabe as censuras não explicitadas, a cultura não valorizada e as verdades não ditas?
Encerrando a primeira parte do programa, “Vida Fuleira – o Artista de Rua e a Bailarina” foi lançado originalmente em 2007. Portanto, é uma das produções mais antigas aqui abordadas. Passado em um cinema pornô, destino de muitas salas abandonadas no final dos anos 1990 e início dos 2000, o filme inicia de pronto.
É preciso dizer que essa também é uma ficção e a ironia igualmente dita seu ritmo. Ao imaginar a projeção de um filme surrealista cheio de simbologias (ou não) em seu roteiro, “Vida Fuleira” embaralha os espaços dos cinema “de arte” e do cinema do mais carnal dos prazeres. Haveria alguma hierarquia entre eles?
Há ainda a referência ao cinema mudo dos primórdios, aquele que se assemelhava muito ao teatro. Todas essas referências fazem do curta-metragem um filme picaresco. É possível que esteja brincando também com o espectador. Existe hierarquia na arte? Se existe, quem a elabora? Será que já não é tempo de implodi-la?
Ficha Técnica do Programa Personagem de Cinema | Parte I
O Baú do Zuzu (Raul Ribeiro, 17′ – Brasil, 2018)
Sinopse: Motivado pelas lembranças do cinema que frequentou durante sua infância, o diretor tem por objetivo resgatar memórias sobre os antigos cinemas que existiram na cidade de Brumado, no interior da Bahia. Busca, especialmente, as histórias do Cine Teatro Fátima e do Cine Teatro Regina, que pertenceram ao seu tio-avô José de Souza Ribeiro, o Seu Zuzu do Cinema.
O Fantasma de Glauber Rocha (L.H. Girarde, 16′ – Brasil, 2019)
Sinopse: Foi encontrada décadas depois de sua gravação, uma fita do programa jornalístico investigativo “Lendas Diretas: Mistério”, edição especial sobre o Fantasma de Glauber Rocha, investigando um boato de que o fantasma do cineasta estaria circulando em sua cidade natal, Vitória da Conquista, sem previsões de seu objetivo. Curiosamente, o programa não foi ar, e apesar do ceticismo, a suspeita é que houve uma estranha interferência sobrenatural no estúdio.
Vida Fuleira – O Artista de Rua e a Bailarina (André Sampaio, 12′ – Brasil, 2007)
Sinopse: Num poeira pornô, uma relíquia cinematográfica é projetada. Pérolas aos porcos. Filme de cinema mudo: drama de picadeiro. O garoto se perde da família e cresce vivendo de pequenos golpes em praça pública. Da cartola de Mr. Mandrix: uma bailarina, um vagabundo, surpresas!
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Programa Personagem de Cinema | Parte I