Sinopse: Mulheres locais de Fernando de Noronha são impedidas de dar à luz na ilha, onde o espaço é cada dia mais disputado com o turismo.
Direção: Joana Nin
Título Original: Proibido Nascer no Paraíso (2021)
Gênero: Documentário
Duração: 1h 18min
País: Brasil
O (Não) Nascer na Ilha
A violência obstétrica, assim como outras que são direcionadas ao corpo feminino, conjuga uma tríade conhecida e fatal de preconceitos: de gênero, de raça e de classe. Não se trata aqui de discutir em qual ordem eles aparecem, nem sobre a complexidade de diversos corpos que hoje gestam seus filhos – lembrando que a diversidade de classificações de gênero fez com que tivéssemos que repensar nossa construção identitária antes limitada e bem definida.
Pois, para além disso, qualquer corpo que se identifique com o gênero feminino sabe que um sinal amarelo acompanha nossas caminhos e escolhas. O medo faz parte de uma série de ações cotidianas que deveriam ser tranquilas. Deveriam. Se já nos cercamos de cuidados quando estamos relaxadas e em ambiente aparentemente seguro, o nascimento de um filho pode ser tornar um momento traumático e doloroso para muitas de nós. É preciso, no entanto, entender que essa violência se apresenta das mais diversas formas e não somente pelo descaso no acompanhamento do pré-natal e nos partos permeados por condutas agressivas e cruéis.
Em “Proibido Nascer no Paraíso“, o nome escolhido pela diretora Joana Nin nos coloca lado a lado uma contradição fundante de nosso país. A beleza natural e a violência imputada desde nosso nascimento. A partir da ilha de Fernando de Noronha, Nin expõe as dificuldades das moradoras para ter acesso ao seu direito de dar à luz. Procurando alternativas improvisadas, as mulheres precisam sair da ilha para conseguir atendimento na hora do parto. Um recorte que foge totalmente de certas posições de privilégios, tais quais mencionamos em uma obra ficcional estadunidense, por exemplo, no tão comentado “Pieces of a Woman” (2020).
Assim, Noronha parece cada vez mais caminhar para ser uma cidade fantasma, sem novos noronhenses. O que pode parecer uma política de proteção ao arquipélago da região Nordeste do Brasil, não se sustenta com essa lógica, já que outras implementações mais necessárias não são tomadas. Não nos parece, portanto, tratar da preservação natural, desculpa muitas vezes dada para conter o crescimento local.
Dessa forma, a dificuldade para as mulheres locais parece apenas mais uma embaraçosa decisão que as faz expor um momento que deveria ser de cuidado e intimidade. Aqui, a violência começa desde antes de se chegar a um hospital. Levadas por decisões alheias às suas vontades se veem ainda mais fragilizadas em um momento no qual as preocupações já são inúmeras.
A cineasta conta um pouco sobre o crescimento populacional da ilha se aproximando de moradores e contadores de histórias. Ao entendermos o crescimento e a construção de Noronha percebemos que a ausência de estrutura naquele território funciona mesmo para afastar a responsabilidade de suporte por meio da administração da localidade turística.
Recolhendo depoimentos de funcionários da saúde, moradoras e informações sobre a possibilidade de se residir no arquipélago ou não, “Proibido Nascer no Paraíso” desenvolve duas questões fundamentais dos direitos humanos: quem tem direito à terra e até que ponto o outro pode controlar uma decisão sobre nosso corpo? Na verdade, as duas fazem parte de uma mesma origem – a necessidade de se controlar as decisões e as mobilidades do outro (no caso, o povo mais debilitado pelos embates diários) em suas opções mais íntimas.
Veja o Trailer: