Saint Frances

Saint Frances Crítica Filme Alex Thompson Pôster

Sinopse: Após tomar a decisão de interromper uma gravidez indesejada, Bridget, aos 34 anos, concorda, ainda que relutante, em ser babá da divertida e indisciplinada Frances, formando um vínculo inesperado com ela e seus pais.
Direção: Alex Thompson
Título Original: Saint Frances (2019)
Gênero: Comédia | Drama
Duração: 1h 41min
País: EUA

Saint Frances Crítica Filme Alex Thompson Imagem

Pavimentando Novos Vínculos

Queridinho do mundo independente desde de sua estreia, o diretor Alex Thompson (de Irene & Marie”, curta-metragem de 2012) apresenta em “Saint Frances” outro belo e sensível filme, que consegue emocionar sem grandes artifícios ao longo da trama. Talvez, uma sequência ou outra escorregue no sentimentalismo, mas, ainda assim, elas parecem bem possíveis dentro dos mundos que o diretor (e também roteirista da obra) criou para as personagens. O filme segue inédito no circuito comercial brasileiro, após exibição durante a Mostra SP de 2019, mesmo com vitórias importantes, como o prêmio especial do Júri e a escolha popular do SXSW daquele ano.

O grande trunfo da comédia dramática vem, no entanto, da construção dessas personagens e dos diálogos que travam durante momentos simples ou de tensão. O longa-metragem se alimenta principalmente do encontro da personagem título, Frances (a pequena e SUPER carismática Ramona Edith Williams) e Bridget (Kelly O ‘Sullivan), sua nova babá. Ou vice-versa. As duas criam um mundo paralelo, até porque a própria Bridget também passa por uma reconstrução tão intenso quanto a chegada de um bebê (na verdade, é bem isso mesmo – mas falaremos sobre a decisão da garçonete/babá posteriormente) e a ida para uma nova escola. Com uma formação invejável e muita expectativa em relação ao seu futuro, a moça não viu a concretização dessas apostas chegar ao longo de seus 34 anos.

Em “Saint Frances” a idade e o momento pelo qual passa Bridget são essenciais para entender seu deslocamento e visível frustração. Em grande parte das interações com os demais adultos do filme, é cobrada por um filho ou por uma carreira mais delineada como se suas maneiras de ganhar dinheiro fossem apenas bicos temporários que estivessem ocupando o lugar de uma grande revelação em sua vida profissional. Para além disso, em um relacionamento casual, ela engravida e opta por não ter a criança. Os dois conflitos principais estão postos. A vida da, então, garçonete poderia ser considerada normal se ela estivesse girando ao redor dos 20 anos, como um flerte denuncia de maneira invasiva e rude, porém já no meio dos 30 é vista pela sociedade como um grande fracasso. Ninguém se preocupa em esconder essa percepção a não ser seu novo interesse romântico (que é magistralmente rejeitado durante grande parte da obra) mostrando, assim, a grande dificuldade da protagonista – a interação social.

Como Frances acaba por ser o contraponto em um momento delicado, é a partir da criança que surgem os alívios cômicos da história lembrando um pouco os bonitinhos “Grande Menina, Pequena Mulher” (2003) e “O Diário de uma Babá” (2007). Respeitem os 30 e muitos da que vos fala. “Saint Frances”, apesar das semelhanças com as outras comédias, dá alguns passos à frente. Além de explorar os dramas mais íntimos de Bridget – que realmente não é mais tão jovem quanto as Molly de Brittany Murphy e a Annie de Scarlett Johansson) – apresenta também a família de um casal interracial de mulheres, tensionando a narrativa desde o início em dois pontos. A relação entre Maya (Charin Alvarez) e Annie (Lily Mojekwu – que já havia trabalhado com o diretor anteriormente) também traz seus conflitos em um Estados Unidos ainda bastante pavimentado pelos ideais do início do século XX encontrando os ecos do american way of life.

É aí que Thompson encontra seu segundo – esse mais grave – escorregão. A própria Bridget parece comprar por vezes a ideia de que a maternidade a levará para algum espaço de conforto. Maya e Annie também resvalam em reações e projeções típicas de um momento histórico no qual ser mãe parecia ser cumprir com aquilo que era esperado, desejado e desejável por/para uma mulher (de qual mulher estamos falando, né?).

Talvez, infelizmente, vivamos em um momento no qual essas confusões ainda são alimentadas por chantagens emocionais que encontramos não somente em casa, mas no trabalho e nos espaços de lazer que frequentamos. Às vezes, parece difícil distinguir se a produção nos afasta ou nos aproxima dessas lendas sobre maternidade que nos são contadas desde a mais tenra idade – mais ou menos a idade de Frances, por volta de seus quatro anos.

De qualquer maneira, questões como o aborto, o casamento homoafetivo, o racismo e machismo são pontuadas e trazidas de modo a possivelmente chegar com mais facilidade à algumas pessoas não tão acostumadas a transitar por esses novos mundos. “Saint Frances” parece, como nós, no meio do caminho.

Veja o Trailer:

Em constante construção e desconstrução Antropóloga, Fotógrafa e Mestre em Filosofia - Estética/Cinema. Doutoranda no Departamento de Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) com coorientação pela Universidad Nacional de San Martin(Buenos Aires). Doutoranda em Cinema pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Além disso, é Pesquisadora de Cinema e Artes latino-americanas.

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