31º Kinoforum | Um Olhar Latino-Americano | Sessão O Ontem e o Amanhã
Sessão O Ontem e o Amanhã
A terceira sessão do recorte latino-americano do 31º Kinoforum, denominada, Sessão O Ontem e o Amanhã, traz obras que olham para o passado para compreender o presente (leia o texto sobre a primeira aqui e sobre a segunda aqui). Ela se desenvolve a partir de um movimento que deveria ser repetido por todo continente. A reminiscência dos erros pode nos ajudar a vislumbrar um presente e um futuro mais saudáveis e deve ser uma das armas possíveis para a luta pela liberdade e igualdade que o homem parece buscar há tantos séculos. Seremos nós capazes de aprendermos com nossos deslizes?
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Os Anéis de Serpente
(Edison Cájas, 2020)
Iniciamos a sessão com uma breve análise sobre o curta-metragem chileno “Os Anéis da Serpente“. Em 25 minutos, o diretor Edison Cájas trabalha com a câmera e a música para criar um clima sombrio. Com a lenta movimentação nos aproximamos dos olhos e dos movimentos da protagonista Ana. Talvez, como uma serpente prestes à dar o bote, os segredos de Ana estão prontos para serem revelados pelo diretor.
Novamente a temática da Ditadura Militar volta – porque permanece em nossos imaginários sociais. Ainda recente, o golpe é acessado de tempos em tempos por diversos artistas como um lembrete, uma prova e uma esperança de que a manutenção viva de seus horrores nos distancie de uma realidade semelhante ao passado brutal.
O filme é estruturado no início dos anos 1990 e revela uma senhora que reconstruiu sua vida e guarda um segredo assustador. Ela foi integrante do grupo que participou das torturas durante a ditadura. Ao ver seu nome ser revelado em uma lista, Ana agora precisa proteger a filha, que sofre de problemas cognitivos e vê o passado assombrar toda a vida que construiu por debaixo de suas máscaras e disfarces. Professora de medicina legal, a senhora precisa encarar o passado que vem para desestabilizar uma base que parecia sólida.
Com fotografia e trabalho de pesquisa (contando aqui acervo de imagem, figurino, maquiagem e direção de arte) que nos fazem voltar ao período, o curta-metragem impressiona pela qualidade técnica e narrativa. Sem dúvida um dos curtas apresentados mais bem amarrados, deve ter vida longa nos festivais da região.
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As Partículas
(Malena Vain, 2019)
A produção argentina “As Partículas“, da realizadora Malena Vain, trabalha a relação delicada entre mãe e filho. Nesse caso, uma relação já complexa parece ainda mais afetada pela instabilidade que cerca a vida de ambos. Passando por uma mudança de casa sobre a qual pouco sabemos, fica a impressão de que há pouco a ser dito entre os dois.
Ou, talvez, haja uma quantidade grande de mágoas as quais não desejam desenterrar. As conversas giram sempre sobre assuntos superficiais. Elas dizem mais sobre uma tentativa de comunicação do filho e uma certa recusa da mãe em estabelecer um contato mais próximo. Com isso, podemos perceber tentativas frustradas de aproximação.
Rotina é o que se instaura na tela. Como alguns filmes que têm o cotidiano como desenrolar, “As Partículas” faz com que criemos vários diálogos paralelos em nossas cabeças tentando compreender o incompreensível, a subjetividade humana. Aos poucos, a mãe de Martín suaviza suas atitudes e revela uma contradição própria a qualquer outro ser.
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HH
(Julian Setton, 2019)
“HH” de Julian Setton é o terceiro filme do recorte latino-americano do 31º Kinoforum que evoca regimes ditatoriais da região. Ao iniciar com dados, o curta-metragem argentino se aproxima dos desaparecidos ao mostrar a casa de Juan Marcos Hermann, único desaparecido na cidade de Bariloche. Seu irmão, Horacio Hermann, fez parte da equipe de um filme em 1985 em uma investida que tem sido utilizada por outras pessoas para a busca de seus familiares.
Aqui a relação entre arte e política se faz direta. Caso tenhamos alguma dúvida sobre a eficácia simbólica de uma obra como a realizada em 1985 ou “HH”, podemos revirar nossos arquivos de memórias e lembrar de tantas outras produções que investigam ou têm o tema do desaparecimento como chama inicial.
Mais do que uma maneira de não esquecer a luta política de nossos parentes, o filme-investigação realizado em cima dos depoimentos de “HH” atua como rememoração de um momento político não tão distante sobre o qual , infelizmente, quase todos temos histórias para contar. Intercalando imagens da produção de 1985 e dessa mais nova, Julian Setton encontra uma maneira eficaz de retomar a história e mostrar a dificuldade que foi fazer este primeiro filme, quando a ditadura ainda pairava pelos ares da Argentina.
Ficha Técnica da Sessão O Ontem e o Amanhã
Anéis de Serpente, Os (Anillos de la Serpiente, Los) (Edison Cájas, 25′ – 2020, Chile)
Sinopse: Chile, 1991. Ana é uma brilhante professora de medicina legal. Ela mora com a filha Ursula, autista. Um dia, o nome de Ana aparece em uma lista de ex-agentes da ditadura. Diante do assédio policial, ela deve proteger o que lhe é mais precioso: Ursula.
Partículas, As (Partículas, Las) (Malena Vain, 14′ – 2019, Argentina)
Sinopse: O vínculo entre um garoto de dez anos e sua jovem mãe é posto à prova quando eles silenciosamente têm de lidar com algumas mudanças em suas vidas.
HH (Julian Setton, 19′ – 2019, Argentina)
Sinopse: Em 1977, o governo militar sequestrou Juan Herman em Bariloche. Em 1985, Carlos Echeverría filmou “Juan Como Se Nada Tivesse Acontecido”, um filme que investigava o desaparecimento. Horacio – irmão de Juan – trabalhou no filme, mas seu testemunho não foi incluído. Trinta anos depois, viajei para encontrá-lo.
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