Leia a crítica de “Unidas pela Esperança”, comédia que chega ao Brasil em 2021.
Sinopse: Em “Unidas pela Esperança”, um grupo de mulheres casadas com oficiais militares decide se unir para formar um coral. À medida que a inesperada amizade entre elas se desenvolve, a música e o riso transformam
suas vidas, enquanto elas ajudam uma a outra a superar o medo pelos entes queridos em combate.
Direção: Peter Cattaneo
Título Original: Military Wives (2020)
Gênero: Comédia
Duração: 1h 52min
País: Reino Unido
No Compasso de Espera
Inspirado em um reality-show britânico que registra o desenvolvimento de corais amadores, “Unidas pela Esperança” se relaciona à temporada de “The Choir” exibida no canal de BBC em 2011, chamada “Military Wives”. Trata-se da história de um grupo de esposas de membros do exército inglês que, em agrupamento em uma base onde aguardam a missão de alguns deles ao Afeganistão, desenvolvem essa atividade. O diretor Peter Cattaneo repete uma fórmula no estilo joie de vivre, semelhante ao maior sucesso de sua carreira “Ou Tudo Ou Nada” (1997). Dentro dela, a comédia como pano de fundo de situações dramáticas e a música como componente de ligação da trama.
A inevitável comparação com “Mudança de Hábito” (1992) é ferramenta de piada no próprio roteiro de Rachel Tunnard e Rosanne Flynn – quando Kate (Kristin Scott Thomas) e Lisa (Sharon Horgan) recrutam as cantoras do grupo. Há uma construção de personagem por oposição interessante nos minutos inicias. Enquanto a primeira parece entender sua condição de esposa como uma função – uma relação mais próxima à visão conservadora de uma posição na sociedade – a segunda busca uma autonomia na sua trajetória naquela comunidade.
O resultado é que temos uma Kate propensa à rigidez, a elevar ao profissionalismo aquelas relações criadas através do coral, enquanto Lisa tende a ver na atividade uma mistura de ocupação e diversão, um amadorismo que quase se leva a sério. Essa dualidade funciona, a química entre as experientes e talentosas atrizes se sustenta. “Unidas pela Esperança” traz um pouco do que seria uma função social daquelas pessoas que sofrem com a distância dos seus companheiros, mas se veem com limitações de trânsito, quase vivendo a guerra naquela base militar maquiada como um núcleo societário majoritariamente feminino. Suas vidas parecem sempre em suspenso, quase no compasso de espera das determinações e orientações que a corporação dará aos parceiros. Algumas, inclusive, se tornam “mães solteiras” nas temporadas em que o marido ou outra esposa passam longe de casa.
É comum essa busca por ações afirmativas e atividades sociais, ainda mais quando você precisa interagir com pessoas as quais não tem o poder de escolha. Antes da esperança, elas estão unidas pela semelhança de relacionamentos. Não se permitem ser pacifistas, porque são “casadas com a guerra”, como a personagem de Kristin diz para um jovem que panfleta contra a manutenção das tropas britânicas no Oriente Médio. Ela, então, lê o mundo pela régua que a tradição familiar bélica lhe deu. Tenta aplicar preceitos disciplinares ao que muitas querem usar como passatempo. Muitas cantoras parecem não ver muita diferença entre o treinamento proposto e uma noite no karokê da cidade. Não que isso signifique amadorismo, basta lembrar da icônica Katia Blander, personagem de 2020 aqui na Apostila de Cinema por conta do curta-metragem “Noite de Seresta” (2020).
Muito do desenvolvimento do filme é padronizado, são arcos até previsíveis. Isso torna a atuação das protagonistas tão limitadas quanto as manifestações de suas personagens. A incomunicabilidade de um período com a tecnologia menos desenvolvida tem um peso, em uma narrativa que, apesar de ocorrer há apenas dez anos, tem uma permissão de distanciamento histórico que tornaria seu drama mais atraente. Por sinal, Kate tem algumas lacunas em sua história que fragiliza a maneira como suas dores são exploradas. Não há incoerência em nenhum momento na trama, apenas espaços vagos – já que observa-se um exagero nos alívios cômicos propostos através da música e das dificuldades de execução por parte das coristas.
A obra, em comparação com “Ou Tudo ou Nada”, por exemplo, não se pauta em nenhuma forma de transgressão. Nem da história e nem da linguagem. É quase como a repetição do registro documental, sem que algumas licenças poéticas possíveis na ficcionalidade ampliasse as sensações. Tanto dramáticas, quanto na comédia. Mesmo assim, “Unidas pela Esperança” garante uma divertida sessão, ainda mais em um momento onde compartilhar projetos em comunidade se torna difícil por nossas impossibilidade de comunicação. Quem se identificar com as trocas que só a reunião física permite, encontrará a obra no momento certo.
Veja o Trailer: