Vó Poster

Sinopse: Maria é uma viúva de 81 anos que vive na companhia de sua gata, seu cachorro e do barulhento casal de calopsitas. Sua rotina é alterada por conta da pandemia que se alastra pelo globo, impedindo-a de realizar suas idas ao mercado, à igreja e à ginástica. Na clausura do confinamento de seu lar, angustiantes pensamentos se intensificam com o passar dos dias.
Direção: Felipe Coelho
Título Original: Vó (2020)
Gênero: Experimental
Duração: 5min
País: Brasil

Vó Imagem

A Eternidade de Um Dia

“, de Felipe Coelho, foi o vencedor do Festival Filmem em Casa da Mostra Zona Norte de Cinema. Pelo voto popular, o curta-metragem trata de uma das questões mais discutidas durante o período inicial de isolamento social causado pela pandemia de Covid-19. Talvez, por isso, observa-se uma grande capacidade de identificação imediata na obra.

Quando a recomendação de que ficássemos em casa a qualquer custo foi dada, o preconceito e a falta de respeito pelos idosos ficou ainda mais latente. Questionou-se muito a incapacidade deles respeitarem a orientação de se fazer apenas o necessário e, em especial os dessa faixa etária, não ir à rua sob qualquer hipótese. Não se trouxe para o centro do debate a carência afetiva, a brusca mudança da rotina, as dificuldades de adaptação causada pela idade, a falta de acesso e intimidade com os aparatos tecnológicos. Houve muita preocupação em julgar e memetizar (na nova acepção da palavra, a de criar memes) o comportamento dos mais velhos.

Felipe fez o que estava a seu alcance. Em um exercício lúdico, registrou a nova rotina da avó, Cida Coelho, confinada em casa. Preocupado com a qualidade do produto audiovisual que gestava, conseguiu material para cortes de diversas metragens e maneiras. Na enviada para o festival, de cinco minutos, há uma montagem que se preocupa em espelhar o tédio, a clausura da protagonista, enquanto a vida lhe cerca, seja por cachorros, pássaros ou plantas. Cida está inserida em uma nova sociedade, aquela que ela precisa dominar para não enlouquecer.

Com isso, “Vó” se torna um curta-metragem com o condão de nos fazer projetar nossas dificuldades. Prestes a completar quatro meses de isolamento, rememorar as vezes em que sofremos para levantar da cama, lavar o rosto, preparar qualquer coisa para comer… Procurar sentido em tudo isso. Para Cida, a criação da obra foi uma arteterapia, o objetivo imediato de construir uma cena sem dúvida lhe ajuda a buscar algo além do acionamento de um piloto automático.

Ao contrário de “Memórias“, segundo colocado da mostra – que se vale da mesma temática – não há na visita ao passado uma tentativa de reimaginar a rotina. Pelo contrário, há a crueza da rotina por si só. Os dois curtas batem forte em nossos sentimentos, cada um à sua maneira. Felipe Coelho nos transporta para um mundo sem palavras (e sem memórias) e nos deixa perdido nos pensamentos sobre nossas quarentenas. Desafiando as convenções sobre o “novo normal”, como se tivéssemos chegado ao auge da existência e daqui iremos ladeira abaixo, ele faz questão de, em um plano-detalhe de ““, mostrar o que a Dona Cida não consegue dizer: ali mora gente feliz.

VEJA O CURTA PREMIADO:

Clique aqui e leia um artigo sobre a Mostra Zona Norte de Cinema.

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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