Você Deveria Ter Partido

Você Deveria Ter Partido Filme Crítica Pôster

Sinopse: Tentando superar o estresse e o ciúme pela esposa atriz, e muitos anos mais jovem, Theo resolve passar uma temporada com ela e a filha num casarão alugado na zona rural da Inglaterra. Mas, em “Você Deveria Ter Partido”, estranhos fenômenos começam a assombrar a família.
Direção: David Koepp
Título Original: You Should Have Left (2020)
Gênero: Thriller | Terror | Drama
Duração: 1h 33min
País: EUA | Reino Unido

Você Deveria Ter Partido Filme Crítica Imagem

Você Deveria Ter Esperado

À primeira vista, “Você Deveria Ter Partido“, que chega esta semana ao catálogo do Telecine com o selo première, parece ser uma das produções menos ousadas envolvendo a Blumhouse. Uma narrativa clássica de criação de expectativa, que usa o perigo iminente como grande elemento de terror. A demora no avanço das representações e no desenvolvimento da trama deverão afugentar a boa vontade de grande parte do público – que, ao redor do mundo, não tem dado cotações muito boas ao filme. Uma espécie de frustração bem parecida com a que move Theo, protagonista vivido por Kevin Bacon.

Antes de deixar uma aparente neurose tomar conta de seu comportamento, pouco sabemos das pessoas envolta daquele homem. Apenas que sua esposa, Susanna (Amanda Seyfried), é uma atriz e que a família é formada também pela filha pequena, Ella (Avery Tiiu Essex). Ao término de uma cansativa gravação  – tanto para a jovem mulher quanto para seu marido bem mais velho e um pouco ciumento – eles decidem passar uma temporada em uma casa no interior da Inglaterra. Como não poderia deixar de ser nas propostas contemporâneas do medo do real, as assombrações são resultado de questões internas do personagem.

Adaptando romance do prolífico autor alemão Daniel Kehlmann (em sua primeira incursão nos cinemas), o diretor e roteirista David Koepp usa uma premissa simples, escancarada no ato inaugural. Constrói Theo como alguém que precisa esvaziar a mente, seja através de conselhos envolvendo a meditação ou pela forma exorcizante com a qual os pesadelos se manifestam. Mais adiante entenderemos os motivos pelos quais ele exercita essa reflexão – e acaba temendo a si mesmo. Sem querer avançar em terrenos de spoilers, já que não é necessário (não deve ser difícil achar os tais vídeos explicados caça-cliques no YouTube), a grande questão aqui é o ritmo que o cineasta imprime na obra.

Koepp usa a tática de manual de dividir “Você Deveria Ter Partido” em três blocos e tentar equilibrar sua duração. Isso dá a sensação de um longa-metragem que não avança, já que, para cumprir a tarefa, ele precisa ser irregular. O passado de Theo e os traumas envolvendo suas relações familiares surgem em pílulas, enquanto que a conversa de Susanna com Ella – cena que demarca o fim do segundo ato – além de deslocada – soa atravessada, fugindo da lógica de uma narrativa que humanizou os laços entre os três personagens.

Ao atropelar as intenções do pai, que ainda não se sentia preparado para revelar uma informação que pode mudar a visão que a filha terá dele, a trama perde a coerência em prol de um encaixe de eventos que são posicionados como âncoras da narrativa. A raiva com a qual poderíamos creditar as motivações da mulher só se justifica com a descoberta do homem mais adiante, quando o terço final se inicia, telegrafando a onda sombria que percorrerá o ato final.

Quando chegamos a este momento, o filme até justifica a associação com a Blumhouse. Faz da culpa cristã de Theo (verbalizada por Susanna quando ela diz que a escola católica ferrou com ele) mais um elemento. Nos instiga a questionar a linearidade e o que seria consequências e causas naquela história, que começa a fugir do nosso controle na mente perturbada do protagonista – enquanto detentor do olhar e das representações postas na tela.

Por fim, no grande terror de “Você Deveria Ter Partido” passa a responsabilidade de ser pai, o medo e a frustração porque nada a vida é tão óbvio quanto as soluções de um filme de gênero e a certeza de que Kevin Bacon traz consigo a imagem de alguém que nunca devemos confiar, desde “O Homem Sem Sombra” (2000) ou “Ecos do Além” (2009) – do próprio David Koepp.

Possivelmente tarde demais para nos convencer de que estamos diante de uma produção marcante dentre os lançamentos recentes. Exige um tempo de espera que talvez ninguém mais tenha. Boa parte deveria mesmo ter partido, pois nossas mentes – em constantes fugas de realidade por questão de sobrevivência – já devem ter feito isso em algum momento durante o processo.

Veja o Trailer:

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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