Zimba

Sinopse: A trajetória e o imaginário artístico do ator e diretor Zbigniew Ziembinski (1908-1978), precursor do teatro moderno na América Latina e mestre de gerações de atores brasileiros. A montagem polifônica parte de um vasto material inédito, que cobre meio século de performances, teleteatros e entrevistas de Zimba, como era conhecido – antes e depois de fugir da Polônia, às vésperas da invasão de Varsóvia –, e recria fragmentos de Vestido de Noiva, peça de Nelson Rodrigues que ganhou do diretor polonês-brasileiro montagem revolucionária em 1943.
Direção: Joel Pizzini
Título Original: Zimba (2021)
Gênero: Documentário
Duração: 1h 18min
País: Brasil

Zimba Crítica Documentário Imagem

Caminhos da Arte

Quem mora no Rio de Janeiro, na região da Tijuca, não precisa ter acesso à história do Teatro Moderno Brasileiro para conhecer o nome Ziembinski. A fachada da casa de espetáculos que leva seu nome na rua Heitor Beltrão destaca esse raro sobrenome no Brasil. O polonês, que chegou ao país em 1941, já com 33 anos, virou ponto de cultura em 1988, dez anos após sua morte. Portanto, desde criança aquela palavra me chamava atenção e, com o passar do tempo, fui saber quem era. Sua trajetória é fundamental para entender as manifestações culturais do século XX – que encontra em “Zimba“, documentário dirigido por Joel Pizzini e parte da mostra competitiva nacional do Festival É Tudo Verdade 2021, um ótimo registro.

Ainda que não aposte tanto na performance quanto “Máquina do Desejo – 60 Anos de Teatro Oficina” – exibido há alguns dias no mesmo evento – a obra começa com o importante reflexão, em uma fala que mistura o depoimento e o lúdico do próprio biografado. Há momentos, na vida do artista, em que ele se cansa de enganar. Soa irônico uma produção que se propõe a falar apenas a verdade sobre um profissional que viveu para mentir, para ser sempre outro. Ou outra. O talento de Ziembinski ultrapassava a construção cênica, a direção teatral. Sua flexibilidade e repertório na atuação o permitiu, nos últimos anos da carreira, renovar seu público, no cinema e na televisão.

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Desta forma, o cineasta não se prende tanto na linearidade em “Zimba“. Opta por segmentar em expressões, em aspectos, sobre o polonês. O caminho pessoal mostra que, antes de chegar no Brasil, ele já tinha feito grandes montagens na Polônia. Planos interrompidos pela Segunda Guerra Mundial, que fez com que a cultura do nosso país pudesse contar com um agente revolucionário no meio. Se mencionamos o Teatro de Arena na crítica sobre o Oficina, precisamos aqui mencionar que – antes daquele – o Teatro Brasileiro de Comédia, criado em 1948, seria o grande pai nessa genealogia das artes cênicas paulistanas.

Isso fez com que Zimba vinculasse sua trajetória tanto com São Paulo quanto com o Rio de Janeiro. Antes de dividir palco com nomes como Cacilda Becker, Paulo Autran, Cleyde Yáconis e Fernanda Montenegro ele entregou aquele que, provavelmente, é sua criação mais emblemática: a montagem de “Vestido de Noiva” de Nelson Rodrigues, em 1943. Diante dessa pluralidade, Pizzini monta o filme a partir de três personagens-narradoras: Nathalia Timberg, Camila Amado e Nicette Bruno. A última, infelizmente, foi uma das primeiras vítimas da pandemia da Covid-19. Um patrimônio da cultura, que ainda jovem deu vida à protagonista.

Pela voz dela e com a adição de difíceis imagens de arquivo, somos levados aos elementos que fez com que essa peça fosse considerada um passo importante na modernização da linguagem – uma delas foram as famosas 240 mudanças de iluminação durante a peça. Segmentar – mas sem deixar de vincular quando possível – é o grande acerto do longa-metragem. São vários Ziembinskis dentro de um, que vai do produtor de obras muito críticas na Polônia ao contratado pela Globo para seu núcleo de produção.

Os vínculos com Cacilda Becker, Tônia Carreira e Walmor Chagas surgem no fim, logo após a experiência na companhia Vera Cruz (mostrando que Ziembinski era das artes e limitá-lo ao teatro seria um erro). Como reflexo do momento de desmonte institucional aliado a uma pandemia, o ponto de cultura com seu nome – mencionado no início desse texto – também corre risco. Por sinal, sempre correu e precisou em poucos anos contar com o auxílio da Prefeitura do Rio de Janeiro. Muito porque estamos em um território que, mesmo com opões em outras regiões, ainda vê a zona sul como grande (senão único) polo dessa atividade, pelos próprio público. Mas, esse é um debate que não cabe ser feito aqui.

Voltando à história contada, nem sempre o biografado conseguiu ser revolucionário. O racismo era presença ainda mais forte no período em que ele desejava que Abdias Nascimento protagonizasse “Anjo Negro“, por exemplo. Acabou sucumbindo às práticas da época e assistiu um ator substitui-lo com a famigerada black face subindo ao palco. Há um diálogo do documentário com outro muito especial, que apresenta para novas gerações Humberto Mauro. O longa-metragem de André Di Mauro, assim como esse, se vale de falas diretas, reflexões do saudoso protagonista, em composição com imagens da época. Ainda que a produção sobre o cineasta seja assim por todo o tempo – e use seus filmes – aqui esses momentos são os de grande destaque. Ao apresentar o elemento da fala direta como uma quebra de narrativa, “Zimba” tira o aspecto excessivamente informativo e se torna ainda mais envolvente.

Veja o Trailer:

 

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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