A Semana da Minha Vida

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Sinopse: Em “A Semana da Minha Vida”, Will Hawkins é um adolescente rebelde que desafia a lei e precisa fazer uma escolha: ir para a detenção juvenil ou para um acampamento cristão. Um peixe fora d’água no início, ele acaba se soltando e encontrando o amor em uma jovem do acampamento. Pela primeira vez e onde jamais poderia imaginar, Will sente que encontrou seu lugar no mundo.
Direção: Roman White
Título Original: A Week Away (2021)
Gênero: Musical
Duração: 1h 34min
País: EUA

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Um Novo Varão

A Semana da Minha Vida” é mais um capítulo da viagem que a Apostila de Cinema faz todas as semanas pelas novidades do catálogo da Netflix. Um choque estético, temático, narrativo e tudo mais o que você possa imaginar, se compararmos com nossos últimos dias, em que a cobertura da Mostra Tiradentes | SP nos permitiu falar de obras provocadoras e de discursos que tocam fundo em questões da sociedade. O musical adolescente dirigido por Roman White (de dezenas de videoclipes, vários do bombástico início de carreira de Carrie Underwood) é mais uma incursão do audiovisual norte-americano em uma trama que traduz valores cristãos de uma maneira moderna. E, veja, esse não é um problema do filme.

Confesso que acho saudável a possibilidade de transitar por temas diversos – ou os mesmos temas por abordagens diferentes. Há alguns dias, “Rodson Ou (Onde o Sol Não Tem Dó)” (2020) subvertia qualquer lógica de unidade fílmica para nos levar ao ano 3000, em que o Brasil encontra-se sufocado por um governo anarcocrenty. A produção que chega agora à plataforma de streaming mais popular do mundo, tem de fato, tem uma unidade. Um ritmo definido, um equilíbrio entre as sequências de dança e canções que emulam o que faz sucesso dentro da música pop contemporânea. Se encontra com o filão de um público de base religiosa, que tratamos em nossa crítica de “Enquanto Estivermos Juntos” (2020), que chegou na Amazon Prime Video também nesse mês. E, veja, essa não é uma qualidade do filme.

Apesar disso, “A Semana da Minha Vida” não é um longa-metragem religioso, nem pretende ser. Ele traça uma ponte que permite a aproximação de um público que não vincula o exercício da fé à ausência de outras manifestações culturais ou privação de comportamentos – dentro do limite ideológico, claro. Mesmo assim, a execução feita por White não contribui para o objetivo. Ao mostrar a história de Will Hawkins (Kevin Quinn), garoto problemático que acaba incentivado a passar uma semana em um acampamento de verão, o filme absorve a caretice da maneira mais enfadonha possível. Além disso, exagera na abordagem referencial, desenhando para o espectador o que ele está vendo.

É válida a ideia de criar um musical, no estilo das franquias “High School Musical” (2006) e, de forma bem direta, “Camp Rock” (2008), se prendendo a uma trama que passa pelo amor de Deus como premissa. Prefira revê-los, se você tem acesso ao catálogo da Disney+. Há espaço para quantas histórias couberem no catálogo da Netflix e, de certa maneira, devemos lamentar que a produção não chegue perto do êxito de “Moxie: Quando as Garotas Vão à Luta” (2021), lançado há algumas semanas, por exemplo. Ainda que flua com mais naturalidade o desenvolvimento das canções do que em “Festa de Formatura” (2020), o longa-metragem não se encontra enquanto produto original. Tem uma base narrativa carregada de obviedade e se ancora em elementos externos para ter alguma graça.

Quando chega no acampamento e descobre que estará no meio de um retiro de base religiosa, Will se apaixona por Avery (Bailee Madison), que já surge com um penteado Tabata Amaral para não ter dúvidas de sua caretice. Ele, então, tentará se envolver naquele ambiente, acreditando na possibilidade de viver um recomeço. Os outros não sabem das suas várias passagens em centros de menores por diversas infrações e o órfão se transforma em um agente passivo daquela comunidade. Não tenta mudar o sistema, mas é recebido de forma que não precisa alterar tanto suas atitudes.

Tendo como companheiro o amigo George (Jahbril Cook), que não consegue expor sua paixão por Presley (Kat Conner Sterling), a história se desenvolve em relações não consumadas de amor e amizade. A sequência romântica “Place in this World”, não recomendada para diabéticos de tão doce, parece um encontro de Troy Bolton com a Deputada do PDT no mundo de Lula Land, quer dizer, de “La La Land”.

Assista “Place in this World”:

Quando as canções ocupam a tela em “A Semana da Minha Vida“, as sequências ganham um pouco mais de força. O uso do referencial é mais inteligente, posto enquanto imagens. Isso leva o público a se envolver com a projeção de uma vida menos careta de George em uma caracterização parecida com The Weekend ou bater a mão na poltrona enquanto ouve algo parecido com todas as boys bands das últimas décadas, no estilo One Direction. Inofensivo talvez seja a palavra, mas é tão inofensivo que nada parece caminhar. Por fim, a direção de Roman White usa algumas repetições que chegam, aí sim, a irritar.

Se as referências musicais são sutis e até divertidas de relacionar, as cinematográficas são mais do que escancaradas – são explicadas. Uma forma de tratar o espectador com inocência, para não dizer burrice. Ao chegar no acampamento, Will e George usam blusas que contém duas frases. O primeiro, surpreendido por estar em um ambiente cristão, pega emprestado a camisa com as palavras “too blessed to be stressed“, uma canção gospel da banda The Joyz Boyz. Como uma brincadeira, o veterano do local usa outra com a frase “save Ferris“, clássica referência a “Curtindo a Vida Adoidado” (1986).

Assim, repetindo a trajetória de “Sintonia de Amor” (1993) com “Tarde Demais para Esquecer” (1957), a tal referência vira a âncora da obra. O que nos divertia pela lembrança nostálgica, vira menções diretas, tanto ao filme estrelado por Matthew Broderick quanto à filmografia de John Hughes, que marcava a trajetória dos protagonistas a partir de transformação, questionando estereótipos. Ao invés de beber da fonte, o texto aqui conta histórias antigas de uma fonte que já secou. Faz o mesmo com “Apocalypse Now” (1979) e “Sr. e Sra. Smith” (2005), precisa transformar falas e representações em um algo mastigado, tirando o pouco de criatividade (mesmo que usurpada) da produção.

No final das contas, tudo o que é vendido antes se transforma no arco bem sucedido das narrativas de fé modernas, mencionadas acima. O ato final passa necessariamente pela dúvida sobre a fé para se concluir que não é preciso se transformar em uma pessoa melhor – apenas encontrar um caminho. Will não parece pronto a mergulhar nos louvores que aquela comunidade entoa quando ele não está lá para torcer o nariz. Aliás, nem essa lição sobre preconceito sobre a fé dos outros conseguimos extrair, porque “A Semana da Minha Vida” se ergue como uma dinâmica trama adolescente sobre a busca por um equilíbrio mundano e espiritual, mas que acaba sendo “vários nada” pela incapacidade de ser alguma coisa.

Veja o Trailer:

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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