Sinopse: “A Verdade Interior” revela o processo de criação de “Telemundo”, projeto colaborativo realizado por James Benning e protagonizado por ele e Sofia Brito. Uma viagem, uma entrevista. O vínculo entre um realizador de cinema com um grande percurso e uma jovem atriz que se lança a retratar o processo criativo que se estabelece entre ambos. Um filme-ensaio na qual estes dois seres encontram formas de ultrapassar as barreiras da língua.
Direção: Sofia Brito
Título Original: La Verdad Interior (2019)
Gênero: Documentário
Duração: 1h 9min
País: Argentina
Só é Louco Quem Sabe
“A Verdade Interior” é a forma como Sofia Brito quer se lembrar da experiência de gravar “Telemundo“, produção de James Benning que faz uma parceria entre as obras no Festival Ecrã. Ela não se preocupa tanto em traçar uma proposta de registro e acaba aproximando sua obra de uma construção próxima ao material original. Mesmo assim, há uma carga biográfica do realizador e professor norte-americano que perpassa o documentário. Não somente pela forma como conhecemos a intimidade de Benning, sua casa na Califórnia. Mas também quando ele traz alguns de seus pensamentos, principalmente aqueles que dialogam com sua criação, feita a partir de uma sessão de “O Castelo da Pureza” (1973).
A principal delas talvez seja a reflexão sobre o tempo. Assistido após a escrita da crítica sobre “Telemundo”, parece que seguimos um caminho parecido com os ideais do cineasta no texto. “A Verdade Interior” traz novamente o conceito da dissociação do tempo como um elemento estanque, quebrantável. Algo que transita entre a ciência e o misticismo e que sem dúvida cruzou o caminho de Benning durante sua experiência lecionando em Buenos Aires. Momento em que teve contato com a atriz Sofia Brito, que transformou essa conexão a partir de um projeto em uma maneira de fechar as triangulações que o trabalho de James faz como múltiplas retas.
Inclusive, a proposta de “Telemundo” casa com a ideia de encontro de si mesmo, de filmes como “A Dança da Realidade” (2013) e “Poesia Sem Fim” (2016). Em “A Verdade Interior” testemunhamos o nascedouro do que Benning imagina executando em seu longa-metragem. Sua inspiração começa pelo clima quente, que o faz lembrar de experiências quando era criança. Ele não precisa se estender na abordagem saudosista, mas fica claro que o diretor almeja esse controle do espaço-tempo, que poderia nos levar a dominar os mais diversos planos de existência. Benning quer criar uma fenda temporal para satisfazer a si.
Há uma importante contribuição de Sofia, já destrinchada na crítica do outro filme, mas que é confirmada ao assistirmos seu documentário. A sensibilidade de trazer Alejandra Pizarnik para o centro das atenções, a partir de um lindo poema. Essa cruzada pela auto-aceitação, que é facilitada quando se é homem, é revisitada por James quando ele fala que suas atuações, em todas as esferas, na verdade são maneiras de entender a vida – e, como objetivo – alcançar a própria paz. Uma experiência que por vezes provoca a ele solidão. Já a autora argentina, de vida trágica, se coloca diretamente como objeto de seu poema, uma exploração que seria feita momentos depois pela dupla Sofia e James.
Chega certo ponto em que a diretora parece desistir de extrair informações de uma pessoa que trabalha a imagem e a arte audiovisual para sintetizar seus conceitos. Brito começa a viver, a transitar pelos espaços abertos por Benning, nos trazendo passeios de carro e conversas bem mais informais. Ela dá a impressão de ter completado seu ciclo de construção de personagem. Até que o final cai como uma luva àqueles que acham que o experimentalismo suga as atenções de um cinema mais representativo e político. James faz uma breve intervenção sobre seu amor pela arte audiovisual. Sofia complementa nos trazendo o fato de que os cursos dos rios não seguem uma lógica, visto que uma linha reta tornaria o caminho três vezes mais curto. A arte da James Benning só quer encontrar seu mar. Ele é um homem que está em paz. E agora podemos ter a certeza de que não quer guerra com ninguém.
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