Sinopse: A vida de dois paramédicos de Nova Orleans é destruída depois de encontrar uma série de mortes horríveis ligadas a um medicamento com efeitos bizarros e sobrenaturais.
Direção: Justin Benson
Título Original: Synchronic (2019)
Gênero: Drama | Thriller | Ficção
Duração: 1h 40min
País: EUA
Curtindo uma Viagem
O esvaziamento do catálogo do Telecine, em um rompante de lançamentos de serviços de streaming no últimos dois anos, como sabemos, não é bom para ninguém. A prova é “Synchronic“, superestreia desta noite de sábado na tradicional faixa das 22 horas do canal. É certo que o espectador não mais se prende ao sincronismo que une a família no sofá – como fazíamos até pouco tempo. Tanto que no aplicativo da rede, as produções são disponibilizadas na manhã do mesmo dia (no embrião do Telecine Play quem perdia “ao vivo” precisava aguardar o domingo).
No filme, Anthony Mackie é Steve, um paramédico que se impressiona com o atendimento a jovens que reagem mal aos efeitos da droga sintética do momento em Nova Orleans, abalado pelo furacão Katrina. Ao mesmo tempo ele passa por um pesado tratamento de saúde, o que o deixa mais próximo da ideia de finitude de sua existência. A escolha do longa-metragem, sem dúvida, passa pela popularidade do ator. No aplicativo do lado, o Disney+, ele vive Sam Wilson, protagonista da série “Falcão e Soldado Invernal” (2021-), que prepara o terreno da Marvel para a fase 5684681 de seu Universo Cinematográfico.
Quando aceitou fazer parte de “Synchronic” essa fama ainda era limitada. Ele já era Falcão, mas com participações secundárias. O que o levaria a ser o rosto de uma obra que não possui personalidade, tornando sua abordagem inicial desastrosa. Os diretores Justin Benson e Aaron Moorhead nos levam por um ato inaugural que não geraria tanto uma sensação de convenção narrativa se fosse um prólogo. Nele, Steve e seu colega de ambulância, Dennis (Jamie Dornan) dão os primeiros socorros a um grupo em estado lamentável – descobrindo que a heroína é o menor dos problemas.
A câmera, então, dá um clima de balada em um daqueles inferninhos onde tudo, principalmente os entorpecentes do momento, são liberados. Tirando o excesso de sangue, a sensação de uma pista de dança recheadas de zumbis é ampliada em um plano-sequência em que o mediador das imagens parece tão doidão quanto os amigos de set. Além disso, a chegada da dupla ao local é antecedida por uma cena que parece saída dos anos 1980, na qual os atores estão em uma esteira simulando andarem com a maca em uma rua projetada em um telão.
Completando a trinca espetacular do trash que se avizinhava em “Synchronic“, ao terem contato em um parque de diversões de uma possível vítima de combustão espontânea, o público é agraciado com um dos bonecos mais toscos que o Cinema criou nos últimos anos. Há, ainda, um encontro de adultos em que uma mulher segura uma manta enrolada como se fosse um bebê – e dessa vez nem uma boneca de plástico de loja de R$ 1,99 foi providenciada, pois é nítida a ausência de peso nas mãos da atriz. A montagem ai coloca o close em uma criança real de forma tão falsa e porca que a paisagem em toda a cena está nublado e o bebê reluz de tão forte que estava o sol no momento desta outra gravação.
Não restaria dúvidas de que as intenções da produção de baixo orçamento era usar a seu favor essas representações, extraindo dos gêneros uma leitura que tornaria a estética parte da diversão. Contudo – e é quando começamos a nos desapontar (ou irritar) – toda essa suposta convenção é sumariamente abandonada em prol de um drama no segundo ato. Ele envolve o sumiço da filha de seu parceiro e os reflexos do tratamento do protagonista. Essa salada nos levará para uma parte final que não é nem trash e nem dramática: é uma viagem lisérgica de Steve, que faz uso da droga enquanto experimento e atravessa o espaço-tempo em uma confusão sobre o real e o delírio.
O que torna o longa-metragem frustrante é a ausência de unidade. Não há nenhum problema em ser de baixo orçamento e nem de criar um arco dramático exagerado no meio de uma ficção – inspirada no real, já que a ideia é desenvolver um produto sintético com os mesmos efeitos da ayahuasca. É difícil precisar se os diretores subdividiram a obra em unidades e, assim como um clássico trabalho de grupo de faculdade, reuniu os slides que cada um fez no laboratório do campus cinco minutos antes da aula começar.
Fato é que, por trás dessa criação atabalhoada, que não nos deixa conectar com nada, há boas propostas. Do lado de Steve, não apenas a sensação da vida escorrendo pelas mãos, mas sua visão de que Dennis, sem os mesmos percalços que ele, parece um pouco ingrato. Nada disso se concretiza. Em nosso texto de “Céu Vermelho-Sangue” lembramos que “Serpentes a Bordo” (2006) divertia ao se assumir uma grande bobagem. Já “Synchronic” se torna uma grande bobagem que não saber como se assumir.
Veja o Trailer: